“Apesar do crescimento do preconceito aos judeus, os brasileiros ainda são acolhedores com a comunidade judaica”, diz Claudio Lottenberg em entrevista - Fundada em 1948, a CONIB – Confederação Israelita do Brasil é o órgão de representação e coordenação política da comunidade judaica brasileira.
Foto: Divulgação CONIB

08.10.24 | Brasil

“Apesar do crescimento do preconceito aos judeus, os brasileiros ainda são acolhedores com a comunidade judaica”, diz Claudio Lottenberg em entrevista

Em entrevista ao Correio Brazileinse, em matéria de Ana Maria Campos, o presidente da CONIB, Claudio Lottenberg, falou sobre o crescimento do antissemitismo no Brasil, o envolvimento do Irá na guerra de Israel contra o Hezbollah e sobre a dificuldade nas negociações para a libertação dos reféns mantidos em cativeiro em Gaza. “Apesar do crescimento do preconceito aos judeus, os brasileiros ainda são acolhedores com a comunidade judaica. O antissemitismo aqui é muito menor do que o vivenciado em outras partes do mundo, algo que diz muito sobre a boa índole do nosso povo", diz ele. Veja a seguir a íntegra da entrevista:

A semana marca uma data que, para os judeus, pode ser comparada ao Holocausto: um ano dos ataques do Hamas a Israel, um massacre que levou ao assassinato de 1,4 mil pessoas e ao sequestro de outras 250. Autoridades, personalidades e especialistas abordaram em 8 de outubro, na Câmara dos Deputados, temas relacionados ao combate ao antissemitismo e à luta contra o terrorismo. O evento foi também uma homenagem pública às vítimas do atentado, em meio à escalada do conflito no Oriente Médio com o bombardeio de Israel ao Líbano e ao Irã e à morte de mais de 40 mil palestinos.

Depois do atentado de 7 de outubro de 2023, foi registrado um aumento significativo nos casos de antissemitismo globalmente. De acordo com o Relatório Anual de Antissemitismo 2024, o número de incidentes envolvendo violência e discriminação contra a comunidade judaica aumentou cerca de 30% em comparação ao ano anterior. No Brasil, entre outubro e dezembro de 2023, o número de denúncias cresceu em quase 800% em comparação com o mesmo período, segundo a Confederação Israelita do Brasil (Conib) e da Federação Israelita do Estado de São Paulo.

Um ano após o ataque do Hamas a Israel, os judeus ficaram mais seguros ou em risco diante de tantos inimigos?

O ataque bárbaro promovido pelo Hamas há um ano foi só o começo de uma campanha orquestrada pelo Irã de atacar Israel em várias frentes, usando os outros grupos jihadistas que a teocracia iraniana arma e financia na região, como o Hezbollah no Líbano, os Houthis no Iêmen, as milícias no Iraque e na Síria. Outra parte importante da estratégia iraniana é mobilizar ativistas e a opinião pública global contra Israel e contra quem apoia Israel. Isso levou um aumento explosivo dos ataques e ameaças contra judeus pelo mundo, inclusive no Brasil. Creio que ao final dessa trágica guerra, Israel estará mais seguro, mas a um custo altíssimo e lamentável para todos na região. Os judeus, por causa de nossa história, temos muita resiliência e estamos unidos diante dessa nova realidade.

 A negociação seria uma forma mais eficiente para libertar judeus sequestrados?

Está havendo negociação para a libertação dos israelenses sequestrados, mas é muito difícil negociar com um grupo extremista que venera a morte e deliberadamente usa seu povo como escudo humano. O Hamas é o grande empecilho para um acordo para a libertação dos reféns As Forças Armadas de Israel divulgaram um balanço com números sobre o último ano. Segundo elas, foram 40 mil ataques a posições do grupo terrorista palestino na Faixa de Gaza. Foram localizadas 4.700 entradas da rede de túneis do Hamas, e mil lançadores de foguetes foram destruídos. Esse grupo terrorista está neutralizado?

O Hamas tem como estratégia usar os palestinos como escudos humanos e se esconder atrás deles, mesmo que isso cause morte e destruição. Pelo que temos visto, o número de ataques do Hamas contra Israel diminuiu muito, e o grupo terrorista já não tem capacidade de atuar como um exército, com brigadas e organização militar. O Hamas militarmente foi derrotado, mas ainda tem força para aterrorizar os palestinos. Gaza estará muito melhor quando se livrar do domínio do Hamas.

A história mostra muitos episódios de perseguição a judeus. A guerra contra o Hamas e o Hezbollah, com ataques a Gaza e ao Líbano, alimenta o ódio a Israel?

Sim. Uma parte importante da estratégia do Irã é a vilificação de Israel no mundo por meio de falsas narrativas. Mas estamos vendo também muito apoio a Israel e aos judeus em várias partes do mundo e no Brasil. Muita gente percebe como são falsas as narrativas que o Irã, o Hamas e seus aliados tentam propagar sobre o conflito atual. Havia um cessar-fogo em Gaza e no Líbano até o Hamas e o Hezbollah provocarem esta guerra, sob o comando do Irã. Israel está se defendendo. Muitas pessoas compreendem isso, apesar das falsas narrativas.

Até onde vão esses ataques?

O Irã e os grupos extremistas que Teerã financia querem destruir Israel e os judeus. Eles dizem isso há décadas, abertamente, em suas cartas de fundação, em seus pronunciamentos públicos, na televisão e nas suas redes. É a principal causa deles. Esses ataques estão submetidos a essa visão agressiva e totalitária, por isso não têm limites.

Como avalia a posição do presidente Lula em relação a Israel? Ele classificou como "inexplicável" o fato de o Conselho de Segurança das Nações Unidas não ter "autoridade" para fazer com que Israel se sente à mesa para conversar e prefira bombardear o Líbano.

O governo Lula abandonou a nossa tradição diplomática de equilíbrio e moderação e laços históricos profundos com Israel. Ele se aproximou da teocracia iraniana, que é a responsável pela atual guerra e em nada se alinha aos valores que o governo diz defender, como a defesa dos direitos humanos e a democracia. Israel tem todo o interesse de negociar a paz com o governo libanês, mas o governo libanês, infelizmente, não tem poder sobre o Hezbollah, que é controlado pelo Irã. O Hezbollah passou a bombardear Israel no dia seguinte ao ataque do Hamas para ajudar o grupo terrorista palestino. Dezenas de milhares de israelenses tiveram de deixar o norte de Israel por causa desses ataques. Israel passou 11 meses alertando o Líbano e o mundo que essa situação era intolerável e reagiria se esses ataques continuassem.

Lula chegou a comparar a morte de palestinos por Israel ao genocídio de judeus pelo regime nazista de Adolph Hitler. Como avalia essa declaração?

Muitos brasileiros e muitos países condenaram essa comparação absurda e ofensiva. Ela mostra um desconhecimento absoluto da realidade, uma distorção totalmente enviesada da situação. Muito triste ver o nosso presidente falar uma coisa dessas.

Há antissemitismo no Brasil?

Sim, e ele cresceu desde o começo desta guerra. Mas é importante ressaltar que o Brasil é um país muito acolhedor aos judeus, e temos o apoio e a simpatia da imensa maioria dos brasileiros. Nossos antepassados chegaram ao Brasil há séculos e desde então nós nos integramos totalmente ao tecido social e produtivo brasileiro. O antissemitismo aqui é muito menor do que o vivenciado em outras partes do mundo, algo que diz muito sobre a boa índole do nosso povo.

Qual é o sentimento do povo judeu um ano após o massacre de 7 de outubro?

Muita tristeza, obviamente. O massacre do Hamas foi bárbaro. O pior ataque contra judeus desde o Holocausto. A tristeza aumentou ao vermos setores minoritários da sociedade reagirem com ódio a Israel, mesmo Israel tendo sido vítima desse ataque. Mas, como disse, vemos também o apoio e a simpatia da maioria das pessoas e lideranças, o que nos dá esperança e força para enfrentarmos este momento tão duro.


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