05.02.25 | Brasil

“Portões de Auschwitz: uma imagem e mil palavras”

Em artigo na Folha de S.Paulo desta quarta-feira (5), André Lajst, cientista político e presidente-executivo da StandWithUs Brasil; Fernando K. Lottenberg, advogado e comissário da OEA para o Monitoramento e Combate ao Antissemitismo; Sabrina Abreu, jornalista, escritora e diretora de comunicação e cultura da StandWithUs Brasil, e Sofia Débora Levy, representante para a Memória do Holocausto do Congresso Judaico Latino-Americano e diretora educacional do Memorial às Vítimas do Holocausto, comentam a recente charge publicada nesse jornal usando o icônico portão de Auschwitz e advertem: “Induzir falsas simetrias com eventos contemporâneos, como em charge infeliz publicada nesta Folha, alimenta o negacionsimo e a desinformação”.  Leia a seguir a íntegra do texto:

Os dizeres "Arbeit Macht Frei" ("O Trabalho Liberta", em português) foram escolhidos por escárnio pelos nazistas para serem colocados na entrada de diversos campos de concentração e/ou extermínio, como Theresienstadt, na atual República Tcheca, Dachau, na Alemanha, e o mais conhecido entre todos, Auschwitz-Birkenau, na Polônia ocupada.

Durante a Segunda Guerra Mundial, havia mais de mil campos de diferentes categorias operados pelos nazistas. Entre todos, Auschwitz-Birkenau entrou para a história como o símbolo máximo do aniquilamento de minorias perpetrado pelo regime hitlerista e seu processo industrial aplicado ao genocídio, incluindo câmaras de gás e fornos crematórios. Um milhão entre os 6 milhões de judeus vítimas do Holocausto morreram ali. Dos 5 milhões de pessoas de outros grupos e minorias assassinados durante a guerra, 100 mil eram internos desse campo.

Charge publicada nesta Folha no dia 31 de janeiro usou o icônico portão arqueado de Auschwitz, mas substituindo a frase "Arbeit Macht Frei" por "Guantánamo" —algo extremamente ofensivo à memória das vítimas.

É verdade que a liberdade de expressão permite a circulação dessa imagem; no entanto, a reprodução do conjunto simbólico nazista deveria ser evitada. Não por censura, mas por ética.

No desenho, há também um boné vermelho com a inscrição "MAGA" (acrônimo de "Make America Great Again", ou "faça a América grande de novo", em português), da campanha de Donald Trump, e três prisioneiros vestindo um uniforme listrado, semelhante aos usados em Auschwitz.

Diante de notícias recentes —o presidente norte-americano divulgou que pretende enviar 30 mil imigrantes ilegais para Guantánamo—, tenta-se atribuir similaridade entre a nova política imigratória dos EUA e o local do maior assassinato em massa da história.

Para quem entrou por aqueles portões —além de judeus, romani e sinti (ciganos), homens gays, comunistas, testemunhas de Jeová, prisioneiros políticos, entre outros—, Auschwitz foi sinônimo de trabalhos forçados, fome, doenças, agressões e morte, num confinamento absoluto entre cercas elétricas e torres de vigilância, de um lado, e, de outro, chaminés por onde saíam as cinzas dos corpos incinerados.

No último dia 27 de janeiro, lembramos os 80 anos da libertação de Auschwitz pelas tropas soviéticas. Na cerimônia realizada no local, ex-prisioneiros usavam vestimentas como as da charge infeliz.

Confeccionados em tecido fino, com listras azuis, por si só os uniformes constituíam uma das incontáveis torturas sofridas pelas vítimas sob a neve do inverno polonês e entraram para a história como símbolo desse sofrimento.

Os trilhos dos trens que carregavam pessoas como animais, o portão com a frase ignóbil, as tatuagens de identificação dos presos, as fotos dos sobreviventes esquálidos encontrados pelos libertadores, as marcas de unhas nas paredes das câmaras de gás, as pilhas de corpos e até o próprio nome Auschwitz estão ligados a um tempo e espaço e devem ser respeitados.

Induzir falsas simetrias com eventos contemporâneos alimenta o negacionismo, a trivialização e a desinformação. Perdemos todos.


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