17.09.25 | Mundo

“Netanyahu e o poder, às custas de um acordo possível”

Em artigo na Folha de S.Paulo desta quarta (17), a ex-diplomata israelense Revital Poleg destaca a preocupação com os reféns que continuam mantidos em cativeiro pelo Hamas, diante da decisão de Israel de manter a guerra na Faixa de Gaza até que todos os sequestrados sejam libertados. Leia a seguir a íntegra do texto:

A nova proposta de acordo para a libertação dos reféns está sobre a mesa há dias. Agora, o Hamas aceita a possibilidade de libertação parcial de reféns. No entanto, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu diz que Israel só aceitará um acordo com a total libertação dos reféns. Até o momento, não há mobilização de seu gabinete ou sequer uma resposta às mediadoras. Com foco na continuação da guerra na Faixa de Gaza, o líder israelense declarou que, se houver acordo, ele acontecerá apenas porque o Hamas estará em apuros devido à pressão exercida sobre ele —e não porque Israel está sob pressão.

O caminho escolhido por Netanyahu é o de não se comprometer com ninguém, cultivando uma ambiguidade e falando em duas vozes. Por um lado, sua exigência de um acordo completo transmite, em aparência, preocupação com todos os reféns, embora já tenha se recusado anteriormente a avançar com qualquer acordo. Por outro, se empenha em manter a coalizão de extrema direita, exibindo firmeza militar, a continuidade da guerra e a promessa de uma "vitória total", apesar dos alertas explícitos do chefe do Estado-Maior de que uma operação prolongada coloca os reféns em risco.

Há uma estratégia calculada: ganhar tempo, manter a névoa, evitar qualquer decisão. E, acima de tudo, assegurar sua sobrevivência política.

O pêndulo permanece em movimento incessante: quando o Hamas percebeu que a opinião internacional pendia a seu favor devido à crise humanitária em Gaza, afastou-se do acordo. Agora, quando Israel se aproxima do avanço militar em Gaza com o apoio de Donald Trump, pelo menos durante as próximas duas ou três semanas, como ele próprio declarou recentemente, o Hamas aceita condições que havia rejeitado semanas antes. Mas, então, Israel volta a mudar suas exigências e condiciona o acordo à libertação de todos os reféns.

Netanyahu se deixou seduzir pela ideia da "quebra decisiva": aquele ponto imaginário em que o Hamas colapsaria e seus combatentes se entregariam. Se, em sua visão, ele projeta uma repetição do "modelo Beirute 1982", quando, às vésperas da entrada das Forças de Defesa de Israel na parte ocidental da cidade, foi firmado o acordo que levou Yasser Arafat a deixar o Líbano, é provável que se iluda.

Quem espera que o Hamas se renda no sentido militar do termo ainda não compreendeu a natureza dessa organização terrorista, tomada por um ódio religioso-islâmico visceral contra a própria existência de Israel, e que não demonstra qualquer intenção de parar. Pelo contrário, o Hamas, para quem a vida humana em geral, e a dos israelenses em particular, não tem qualquer valor, continuará a lutar a qualquer preço.

Em vez de derrubar o regime do Hamas, o que se deteriora é a legitimidade de Israel perante a comunidade internacional, bem como a legitimidade que a própria guerra possuía em sua origem, em resposta aos crimes de 7 de outubro. Em vez de interromper os combates e trazer os reféns de volta rapidamente, Israel pode acabar atolada nas areias de Gaza, quando talvez já não haja mais ninguém para resgatar, enquanto acumula mais baixas entre seus soldados e mais tragédias, como o bombardeio equivocado ao hospital de Khan Yunis, que custou a vida de 20 pessoas, a maioria inocentes.

A conclusão é clara e dolorosa: a operação em Gaza não levará ao colapso do Hamas como Netanyahu promete; garantirá a sobrevivência de seu governo. Um acordo abrangente para a libertação dos reféns e o fim da guerra não nascerá dessa ofensiva —apenas gerará mais sangue, mais dor desnecessária.

Revital Poleg, colaboradora do Instituto Brasil-Israel, é diplomata israelense aposentada; trabalhou com Shimon Peres durante os Acordos de Oslo.


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