01.07.22 | Cultura
Bernardo Sorj fala sobre “Religião, Democracia e Educação no Brasil”, obra que está sendo lançada esta semana
Com mais de 30 livros publicados – entre eles ‘Corações e Mentes – Pensando de forma Autônoma Fora e Dentro da Internet’; ‘Em que mundo vivemos?’; ‘Sobrevivendo nas Redes – Guia do Cidadão’ e ‘Ativismo político em tempos de internet’ -, o sociólogo Bernardo Sorj fala à CONIB sobre a obra “Religião, Democracia e Educação no Brasil”, que ajudou a organizar junto com Sergio Fausto e que está sendo lançada nesta semana em versão eletrônica e conta com a colaboração de autores como Carlos Eduardo Braga, Danilo Martuccelli, Ed René Kivitz, Fellipe dos Anjos, Joana Zylbersztajn, Júlia Mafra, Leonardo Rosa e Simon Schwartzman. A publicação é uma iniciativa da Plataforma Democrática, da Fundação Fernando Henrique Cardoso. Baixe gratuitamente o livro.
Como está sendo o lançamento do livro?
Ele está sendo lançado nesta semana, em forma eletrônica e com acesso gratuito e, no dia 31 de maio às 17:00, estaremos realizando um debate online sobre o tema. As inscrições podem ser realizadas em:
https://rd.fundacaofhc.org.br/lancamento-livro?utm_campaign=religiao_democracia_e_educacao_no_brasil_d1&utm_medium=email&utm_source=RD+Station
Qual a relevância do livro para o momento atual?
O livro é uma realização de Plataforma Democrática, um projeto conjunto da Fundação Fernando Henrique Cardoso e o Centro Edelstein de Pesquisas Sociais. Nossa preocupação com o futuro da democracia nos levou a abrir o debate sobre os riscos que entranha a crescente mistura e usos da religião para avançar agendas políticas. Se trata de um tema que exige um diálogo respeitoso entre todos aqueles preocupados com o futuro da democracia no Brasil.
Por que é importante a separação entre Estado e religião?
Porque não existe democracia sem uma clara separação entre religião e Estado. A separação protege as diversas crenças de não serem maculadas por interesses políticos – seja de agendas que não dizem respeito a objetivos espirituais ou ao uso indevido de recursos públicos para avançar interesses de grupos -, e protege a missão do estado democrático, de ser o guardião das liberdades de todos os cidadãos, independentemente de suas crenças pessoais.
A laicidade do Estado foi violada com a decisão do Supremo Tribunal Federal de, em 2017, aceitar que o ensino religioso seja oferecido nas escolas públicas?
A Constituição de 1988, que representou uma importante conquista na defesa de direitos civis, políticos e sociais, também se caracterizou por incluir uma variedade de artigos que respondiam a interesses corporativos, que não deveriam ter lugar na nossa Carta Magna. Entre eles se encontra o Artigo Art. 33. “O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.” A BNCC (Base Nacional Comum Curricular), aprovada em 2017, estabelece os parâmetros da Educação Básica, como estabelecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996. Depois de marchas e contramarchas, a BNCC terminou incluindo o Ensino Religioso, como uma matéria diferenciada, deixando de ser uma disciplina para se transformar em Área de Conhecimento. Na proposta da BNCC fiel aos termos definidos na Constituição, o Ensino Religioso é uma matéria facultativa e não proselitista, se concentrando na educação para o respeito à diversidade, a ser oferecida durante nove anos do Ensino Básico.
Em 2017 o Supremo Tribunal Federal, por 5 votos contra o quatro, decide que o ensino confessional nas escolas públicas poderia ser permitido.
A situação criada pelo STF é contestável do ponto de vista jurídico, mas, sobretudo, ou bem impossível de operacionalizar ou favorece as correntes religiosas majoritárias. Sendo o Brasil um pais com diversidade de crenças, as escolas deveriam ter professores que cubram a variedade de correntes religiosas, e por nove anos! Algo que se encontra além dos recursos humanos e sobretudo financeiros disponíveis. Caso ofereça a matéria somente para o grupo religioso majoritário, estaria praticando uma política discriminatória.
Como está hoje a situação do ensino religioso nas escolas públicas e qual a situação do Brasil sobre o tema em relação à América Latina e Europa?
Não temos dados precisos sobre o tema. Em torno da metade das escolas oferecem a matéria, sendo que uma minoria relevante entre elas oferece ensino confessional. Não sabemos por quantos anos os cursos são oferecidos. Em relação ao resto da América Latina, cada país apesenta um cenário diferente. Sobre a Europa, em outubro a Plataforma Democrática estará publicando um livro sobre o tema. Devemos lembrar que a separação entre estado e religião é um processo histórico, e os países democráticos, em um processo não linear, tem avançado no sentido de uma clara delimitação entre ambas esferas, não somente na educação, mas também em áreas fundamentais, como organização da família, direitos da mulher ou orientação sexual, áreas nas quais as sociedades modernas mantiveram tradições de origem religiosa.
Como deveriam ser as relações ideais entre religião, política e escola?
A democracia é um ideal, ela indica um caminho, portanto não é um ponto de partida nem um ponto de chegada. O ideal é avançar no sentido da consolidação da democracia no país, lembrando que a democracia inclui o direito de criar novos direitos. No caso da educação religiosa, considerando a atual realidade brasileira, é que ela seja uma matéria ao serviço de ensinar o respeito a diversidade de crenças e o conhecimento de outras tradições religiosas, de forma a eliminar preconceitos associados a ignorância.
Bernardo Sorj, cursou o B.A. em História do Povo Judeu e o M.A. em Sociologia na Universidade de Haifa, Israel, e obteve o título de Ph.D. em Sociologia pela Universidade de Manchester, Inglaterra. Foi professor titular de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e catedrático e professor visitante em diversas universidades e centros de pesquisa na Europa e nos Estados Unidos. Autor de 30 livros publicados em várias línguas e mais de 100 artigos acadêmicos. Atualmente é diretor do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais e de Plataforma Democrática.